O resgate da Leviandade
Álvaro Melo
Era um fim de semana daqueles para jipeiro nenhum botar defeito: convocados pelo RTC -
Rio Trail Clube - a fazermos PCs num Enduro de motos, organizamo-nos em 2 grupos, para
atuarmos nas regiões de Miguel Pereira/ Paty do Alferes e Vassouras/ Mendes.
O 1º grupo, ficou alojado em Paty do Alferes e como a nossa atuação seria na parte
da manhã, marcamos um churrasco no meu sítio para onde convergiriam todos os PCs assim
que fossem terminando suas tarefas. O fim de semana prometia: caia uma chuvinha fina e
persistente e as estradinhas estavam em petição de miséria, ou seja, além dos PCs
tínhamos diversão assegurada só por ter que andar naquelas estradinhas.
Estávamos saindo de 91 ou recém-entrados em 92, e eu tinha um Niva novinho que estava
estreando na nossa frota 4x4. Como tínhamos que adotar as providências para o churrasco,
ficamos (eu e minha mulher, Sônia) com o 1º PC, cujo encerramento seria por volta das
10:30h tempo suficiente para chegarmos ao sítio e armarmos nossa festinha.
Concluímos nosso trabalho em baixo de chuva e fomos embora por um caminho rápido,
alternativo e perigoso, pois nos levou a descobrir que o Niva, tão rápido na terra em
relação aos nossos outros 4x4, também sabia derrapar e, coerente com seu 4x4
permanente, sua derrapagem também foi nas 4, de lado prá cima de um poste!! A um meio
metro do poste ele parou e antes que a perna começasse a tremer, engrenei uma segunda,
metí o pé na lata e fui embora, enquanto a Sônia não recuperava a voz para me
esculhambar.
Em casa, churrasqueira acesa, cervejas no gelo e a carne começando a assar, começam
a chegar as duplas. As últimas duplas previstas seriam as comandadas pelos meus filhos,
Fábio com a Band e Márcio com a F-75, os quais pelo conhecimento da região e
experiência off-road acumulada, foram designados para os locais mais difíceis, ambos com
acesso pela Lagoa das Lontras, localidade bucólica e de dificil trânsito em dias de
chuva.
Enquanto nos divertíamos com a chegada do Luis Claudio (Kareka) cuja
esposa, meio
rechonchuda e usando uma calça de lycra daquelas bem colantes, havia escorregado numa
descida a pé (não quis ir no jipe porque era perigoso...) e descera a rampa de uns 40/50
m de bunda e quicando em cada poça de lama, as linguiças iam assando e a carne
tomando côr. As latinhas de cerveja também iam tombando em sequência e o papo animado.
De repente, na estradinha lá fora o conhecidíssimo ronco da F-75 (pelo menos para mim)
e logo em seguida entra o Márcio, com uma cara meio esbaforida e exclama:
- Precisamos ir resgatar o Fábio e a Toyota!
- Calma rapaz, senta aí, pega uma cervejinha, uma linguicinha que nós já vamos...
- Vocês ainda não entenderam, a Band está pendurada na borda de uma ribanceira,
balançando perigosamente. Não sei nem se eles conseguiram saltar de dentro dela... |
A turma do deixa disso entrou rápido em ação e enquanto posicionavam os jipes,
enfiaram uma camera fotográfica nas minhas mãos que procuravam um pescoço para
esganar... Daí as fotos terem ficado com a alça da máquina atravessando na frente.
Ainda bem que saíram pois eu estava tremendo de raiva!!
O resgate levou mais de uma hora. A Band, mais pesada, passou para trás
da nossa manobrou, e jogou a roda dianteira direita no bueiro para ficar escorada.
Dali, lançou o cabo do guincho em angulo na traseira da Band-Gangorra. Os CJ-5,
engatados pelo Tow-bar também entraram na vala do outro lado e lançaram o cabo do
guincho na dianteira da vítima. O resgate foi feito em puxadas milimétricas, até que a
frente da Toyota passasse por cima da borda e ficasse em posição sem risco. Daí, foi
só puxá-la mais para trás, desengatar os cabos e ajudar os socorristas a saírem
das
valas onde se meteram. O companheiro do Fábio, seu velho amigo João Luiz, estava de
viagem marcada para a Alemanha onde ia fazer mestrado/doutorado em metalurgia, sua
especialidade, e teve a sorte de perder naquela lama sua carteira com todos os documentos.
Como não foram achados é de se presumir que façam parte do leito da estrada até hoje,
já que certamente ficaram sepultados na lama... |